A minha avó morreu.
Para mim dizer 'até já' à minha avó de 87 anos, não foi apenas a dor da despedida de alguém que amo com todo o meu coração e que viveu a vida como poucas pessoas que eu conheço, mas sim o fechar de um ciclo.
Na minha família tudo se inverteu, os filhos morreram primeiro do que os pais. Por isso para nós as avós são a âncora que indica de onde nós vimos, quem somos, qual o som e o cheiro das nossas casas, a comida que gostamos, o trato que aprendemos. São elas que nos ligam à nossa essência para que a vida não nos confunda mais do que já fez.
Fechar este ciclo é a certeza de que as poucas memórias que tenho, são agora de cada vez menos pessoas e que o meu futuro só é vigiado pelos que me amam numa outra dimensão diferente da minha.
Aqui, resta-me vigiar o futuro dos meus, reforçar os laços que ficam, fazer crescer o que ainda é pequeno e ter sempre a certeza que o meu caminho tem de ser feito por mim. Eles sabem que nós estamos aqui, olham por nós tenho a certeza, cuidam de nós. Mas a mim, faz-me falta o cheiro, o toque, o som da voz, o cuidado por quem nos quer mais e melhor do que qualquer pessoa.
Da minha avó levo um exemplo que nunca serei capaz de alcançar, uma vida autónoma e auto suficiente até ao fim dos seus dias, morrer a fazer o que mais se gosta, não se lembrar do que é chorar, saber viver para os outros, para a natureza, levar o passar dos dias com a cadência do sol, dos animais e das plantas. Ela não precisava de dinheiro, não tinha ambições de ser outra coisa que não a que era, nunca a ouvi falar mal de alguém ou desdenhar o que quer que seja, nunca ouvi da sua boca a palavra morte ou velhice, a vida era o que era e ela encaixava na perfeição no meio da sua terra, das flores e dos animais, ali tudo tinha um sítio, ali o mundo era perfeito, era o mundo dela e felizmente um pouco também do nosso.
Graças a ela sei como as plantas crescem e sei que a vida se pode fazer apenas trabalhando e trocando aquilo que as nossas mãos produzem, sei o que é beber malgas de café e comer pratos de aletria, sei que uma casa se quer apenas com o essencial e que tudo o resto 'só consome'. A riqueza está em nós e naqueles que nos amam. A vida é isto. E é uma boa vida.
O amor é maior do que tudo.
Até já avó, vemo-nos do outro lado.
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Amiga, força e um abraço bem forte.
ResponderEliminarO amor é isso mesmo. Mesmo.
Beijo
Obrigada Pedro, um beijo para vocês também.
EliminarQue palavras tão mas tão bonitas.
ResponderEliminarde certeza que a tua avó deve sentir um enorme orgulho em ti assim como tu sentes dela.
Custa tanto perder as pessoas que amamos ...
Força
As palavras escritas às vezes explicam as coisas muito melhor do que as faladas...
EliminarObrigada
Um Beijinho repleto de carinho.
ResponderEliminarObrigada
EliminarUm beijinho e um abraço sentido! Força.
ResponderEliminarObrigada Lígia
EliminarUm grande abraço, Silvia. Obrigada por nos falares da tua avó. Um belissimo exemplo.
ResponderEliminarObrigada eu Luísa, pelo carinho das pessoas que por aqui passam...
EliminarSilvia, muito bonito o que escreveste! um beijinho grande para ti***
ResponderEliminarObrigada Joana***
Eliminaroohh Silvia, um beijinho grande para ti!
ResponderEliminarQue palavras tão bonitas que encontraste para escrever aqui. Um grande beijinho.
ResponderEliminarFilipa, este espaço por vezes também me salva:)
EliminarOh, a tua avó que eu conheci no ano passado? Uma senhora super simpática foi o que vi naquele breve contacto.
ResponderEliminarUm abraço amiga
Não é a do Algarve Sandra, é a outra.
EliminarObrigada. bjs
Uma homenagem linda e muito emotiva. Soubeste explicar o que já senti, mas nunca soube verbalizar: que com a partida dos nossos ascendentes se vão uma data de memórias, algumas que nunca chegaremos a saber. E que de repente as memórias, somos nós. Nós ficamos com esse papel. Sinto muito. Beijo.
ResponderEliminarObrigada Val, também escrevo aqui para poder verbalizar coisas para mim própria que por vezes me são difíceis, fico contente que outros se identifiquem também.
EliminarQue olhar bonito que tens, é bom ler-te. Eu perdi a minha avó pouco depois de ter sido mãe pela primeira vez, foi uma dor grande mas que o facto de ter tido a Rita ajudou-me a aceitar, a perceber, a encaixar. Foi há 14 anos e ainda hoje penso nela quase todos os dias, é uma ausência constante na minha vida, na minha alma, no meu coração. É tão serena e tranquila esta tua partilha... tens uma forma de olhar a vida muito bonita. Abraço Sílvia.
ResponderEliminarObrigada Alexandra, abraço para vocês
EliminarSei tão bem o que sentes. Um abraço grande.
ResponderEliminarabraço Virgínia
EliminarSílvia, que exemplo de vida! A nossa geração teria muito a aprender com a tua avó (falo por mim, pelo menos)... "a vida era o que era e ela encaixava na perfeição no meio da sua terra, das flores e dos animais, ali tudo tinha um sítio, ali o mundo era perfeito, era o mundo dela e felizmente um pouco também do nosso." É a isso que aspiro. Um grande beijinho para ti.
ResponderEliminarTodos desejamos algo assim, mas é tão difícil viver assim nos nossos dias...
EliminarOlá Sílvia:
ResponderEliminarDesta vez, não deu para te ler e ir embora. Já te falei dessa minha timidez ocasional. Mas desta vez não deu para isso da timidez e quis escrever. Para agradecer o teu texto. As imagens.
É bem difícil dizer a perda, a ausência. Falar do que esteve e já não está. Neste caso, de quem esteve. O ponto é que as existências se prolongam. Não há volta a dar. A tua avó prolonga-se. Nesse legado que vos deixou. Nessa janela, nas flores todas misturadas, na terra de que cuidou. E nas coisas todas que deixou em ti. As que já aprendeste e as que vais aprender, ainda. A vida é assim mesmo. Pode ser um lugar bem estranho, às vezes. Mas as pessoas e os lastros que deixam, podem salvar.
Tiveste a dádiva de uma avó bem especial. E isso é muito lindo.
Um abraço grande.
Mar
Obrigada Mar, as tuas palavras são sempre tão bonitas:) abraços.
EliminarUm grande beijinho Sílvia...
ResponderEliminarHá pessoas que nunca nos deixam mesmo que não estejam ao nosso lado.
Obrigada Patrícia:)
EliminarUm abraço, Sílvia.
ResponderEliminarTão tocantes essas palavras, essas imagens, as flores, o canto da janela, o que continua depois da partida.
Sei bem o que é isso, de ir perdendo as referências anteriores e sentir que o bastão foi passado a nós.
De novo, um abraço, o amor não morre.
Não morre não Dani. Obrigada!
EliminarBeijo e abraço apertado!
ResponderEliminarAbraços Rita
EliminarLinda homenagem, Sílvia. Obrigada por nos dares a conhecer um pouco da tua avó, uma mulher maravilhosa.
ResponderEliminarBeijinhos,
Marta
Para quê Mestres, Deuses, Santos ou outros que se enaltecem cegamente e nos privam de descobrir na vida de um ser humano o que há de mais essencial, puro e mágico. Há pessoas que não são deste mundo mas que passam por cá para que outros possam aprender com elas, sem a pretensão do Mestre, a adoração do Deus ou a devoção do Santo. Tudo o que disseste da tua avó, é o fruto da passagem dela por cá. Quem sabe reconhecer o lugar a que pertence e faz da aceitação não um acto de comiseração mas um júbilo da vida - é um simples santo!
ResponderEliminarQue deixou uma linda semente...
Este texto emociona-me.
ResponderEliminarUm grande beijinho.
<3
ResponderEliminarlamento muito Sílvia, não raras vezes recordo-me das rendas de musica da tua avó... achei uma parceria fabulosa e encantou-me a beleza do seu trabalho... uma alma e umas mãos assim, são uma perda imensa... isto é a vida, por aqui tb se inverteu a ordem dos acontecimentos e a minha avó tb é o meu porto seguro... ainda assim somos umas privilegiadas por testemunhar a força e saber destas mulheres... e um dia acredito que isso sobressairá em nós. Beijinho
ResponderEliminarOlá Ana, não é essa avó, é a outra. Beijos para ti e obrigada pelas palavras simpáticas.
EliminarHá umas semanas confessaste como lidas mal com o cancro, porque esse cabrão te levou os pais. Nesse dia a minha mãe estava no hospital a lutar contra ele. Hoje escreves sobre a tua avó e descreves uma mulher como não há igual, uma descrição que em grande parte corresponde à da minha mãe. A minha mãe morreu há 3 semanas... mas eu também sinto que eles continuam connosco, a olhar por nós. O seu exemplo enche-nos de orgulho e inspiração. É isso que nos faz chorar mas que ao mesmo tempo nos dá força para sermos e fazermos o nosso melhor. Um grande beijinho para ti Sílvia.
ResponderEliminarOlá Marta. Como te compreendo, ou como nos compreendemos, não é? Força!
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